11/12/2012

ESPERA

Entre uma respiração e outra curvo meu olhar estreito.Limite do amargo , intervalos da ausência.
E nesse áspero das horas ,falta a pele dele para afundar o meu corpo, cadência que sussurrava na pontas dos dedos.
Gosto borrifado nos lençóis, nos isentávamos dos limites e deitávamos as urgências no descomunal do explícito .
Nada restava de sóbrio no fugidio de nossas vontades, nos pelos eriçados e nas mãos que se comprimiam.
Porta fechada.
Dúvidas estáticas na sua demora.Permito a espera que por vezes arde em descompasso.
E no acostumado da memória ,sinto ainda a intimidade repousada, vez em quando me ausento numa tentativa de desprender o caminho de nós dois.

(Eliana de Oliveira Santos)

03/12/2012



















O NADO DA DOR

Sou um conto de dores
com luz de abajur.
Sou uma cascata de choros
sobre um rio de gozos.

Dois remos cansados
em águas febris.
Infindo nado noturno
entre laços naufragados.

No intervalo das gotas
pelos cotovelos sangradas
emudeço...
escorro nua pelo silêncio.

(Poema: Flávia Soufer / Ilustração: Sérgio Dassie Genciauskas)

29/11/2012


SEGUNDO A FLOR DA MINHA PELE

O que sou de mim
eu nunca quis
ser diferente
do que de mim sou
Em ter-me preto a minha pessoa,
dentes e cabelos
Também e assim é
pelo que se vê
pessoa minha de pés enorme
das vistas vê-lo
e também as chagas
De deixar-se pensar em se deixar
a tempos, corpo, sorte
e modo de viver
no éter da matéria
Do que em mim há
por minha pessoa preta
Assim e também é
por pessoa minha primeira
que por dentro em mim sou
de gente que não se é de ser
de sentir-se gente
Pelo que de preto
cabelos, dentes e pessoa é
De pessoa sem imagem,
Malogro,
e benquista pelas calçadas,
a vagar sonhos, mundos
e buracos de vida
Também e assim é
que de não em vida ser mais
restou-me em existir
do que de mim carrego
por menos que me seja o ser
sou o mesmo que me suporto
De sonho a dor,
em primeira pessoa,
do que de mim sou,
segundo a flor da minha pele
No que eu nunca quis
ser diferente
do que sou de mim.

Eduardo José Nascimento, Recife, 1999.
POEMITO SEM COMPROMISSO

Te amo com a força dos meus nervos
Um coisa trêmula de ser
Um desatino febril
Te amo com tanto medo
que por vezes meu desespero
se aquece sentindo frio

eu mesmo dia desses , SP, que tb pode ser novembro de 2012.

(Eduardo Monga)

26/11/2012

O que você faria se só te restasse um dia ?
Se o mundo fosse acabar.

Amanheceria em risos
brincando em poças d'água.

Despindo -me
das mesmices

Meu amor o que você faria se só te restasse um dia ?
Se o mundo fosse acabar .

Alinhavava os versos
soltos e inacabados

Sem sustos percorreria atalhos
contornando bocas alheias

Meu amor o que faria se só te restasse um dia?
Se o mundo fosse acabar.

Meu amor o que faria se só te restasse um dia?
Se o mundo fosse acabar.

Esquentaria as palavras
desatando todos os nós
em abraços

Meu amor o que faria se só te restasse um dia?
Se o mundo fosse acabar.

Escorreria
em orgasmos múltiplos

E adormeceria impune
com as mãos no colo.


(Eliana de Oliveira Santos)


29/10/2012

DEUSA MÃE

Aquela das águas e das rosas
Aquela dos ventos e das brisas
Aquela das raízes e das terras férteis
Aquela dos fogos que aquecem e iluminam
Aquela dos segredos e dos medos
Aquela das tempestades intensas
Aquela dos suspiros infindos
Aquela das viagens insólitas
Aquela dos versos líricos
Aquela das magias das liras
Aquela dos tsunamis e dos redemoinhos
Aquela dos mistérios beijáveis
Aquela das festas das ervas
Aquela dos horizontes e das margens
Aquela dos perfumes interiores
Aquela dos vultos dançantes
Aquela dos sorrisos sagrados
Aquela que vem e que salva.

(Flávia Soufer)

05/10/2012

MINHA CABEÇA ESTREMECE

Minha cabeça estremece com todo o esquecimento.
Eu procuro dizer como tudo é outra coisa.
Falo, penso.
Sonho sobre os tremendos ossos dos pés.
É sempre outra coisa, uma
só coisa coberta de nomes.
E a morte passa de boca em boca
com a leve saliva,
com o terror que há sempre
no fundo informulado de uma vida.

Sei que os campos imaginam as suas
próprias rosas.
As pessoas imaginam os seus próprios campos
de rosas. E às vezes estou na frente dos campos
como se morresse;
outras, como se agora somente
eu pudesse acordar.

Por vezes tudo se ilumina.
Por vezes sangra e canta.
Eu digo que ninguém se perdoa no tempo.
Que a loucura tem espinhos como uma garganta.
Eu digo: roda ao longe o outono,
e o que é o outono?
As pálpebras batem contra o grande dia masculino
do pensamento.

Deito coisas vivas e mortas no espírito da obra.
Minha vida extasia-se como uma câmara de tochas.

- Era uma casa - como direi? - absoluta.

Eu jogo, eu juro.
Era uma casinfância.
Sei como era uma casa louca.
Eu metias as mãos na água: adormecia,
relembrava.
Os espelhos rachavam-se contra a nossa mocidade.

Apalpo agora o girar das brutais,
líricas rodas da vida.
Há no esquecimento, ou na lembrança
total das coisas,
uma rosa como uma alta cabeça,
um peixe como um movimento
rápido e severo.
Uma rosapeixe dentro da minha ideia
desvairada.
Há copos, garfos inebriados dentro de mim.
- Porque o amor das coisas no seu
tempo futuro
é terrivelmente profundo, é suave,
devastador.

As cadeiras ardiam nos lugares.
Minhas irmãs habitavam ao cimo do movimento
como seres pasmados.
Às vezes riam alto. Teciam-se
em seu escuro terrífico.
A menstruação sonhava podre dentro delas,
à boca da noite.
Cantava muito baixo.
Parecia fluir.
Rodear as mesas, as penumbras fulminadas.
Chovia nas noites terrestres.
Eu quero gritar paralém da loucura terrestre.
- Era húmido, destilado, inspirado.
Havia rigor. Oh, exemplo extremo.
Havia uma essência de oficina.
Uma matéria sensacional no segredo das fruteiras,
com as suas maçãs centrípetas
e as uvas pendidas sobre a maturidade.
Havia a magnólia quente de um gato.
Gato que entrava pelas mãos, ou magnólia
que saía da mão para o rosto
da mãe sombriamente pura.
Ah, mãe louca à volta, sentadamente
completa.
As mãos tocavam por cima do ardor
a carne como um pedaço extasiado.

Era uma casabsoluta - como
direi? - um
sentimento onde algumas pessoas morreriam.
Demência para sorrir elevadamente.
Ter amoras, folhas verdes, espinhos
com pequena treva por todos os cantos.
Nome no espírito como uma rosapeixe.

- Prefiro enlouquecer nos corredores arqueados
agora nas palavras.
Prefiro cantar nas varandas interiores.
Porque havia escadas e mulheres que paravam
minadas de inteligência.
O corpo sem rosáceas, a linguagem
para amar e ruminar.
O leite cantante.

Eu agora mergulho e ascendo como um copo.
Trago para cima essa imagem de água interna.
- Caneta do poema dissolvida no sentido
primacial do poema.
Ou o poema subindo pela caneta,
atravessando seu próprio impulso,
poema regressando.
Tudo se levanta como um cravo,
uma faca levantada.
Tudo morre o seu nome noutro nome.

Poema não saindo do poder da loucura.
Poema como base inconcreta de criação.
Ah, pensar com delicadeza,
imaginar com ferocidade.
Porque eu sou uma vida com furibunda
melancolia,
com furibunda concepção. Com
alguma ironia furibunda.

Sou uma devastação inteligente.
Com malmequeres fabulosos.
Ouro por cima.
A madrugada ou a noite triste tocadas
em trompete. Sou
alguma coisa audível, sensível.
Um movimento.
Cadeira congeminando-se na bacia,
feita o sentar-se.
Ou flores bebendo a jarra.
O silêncio estrutural das flores.
E a mesa por baixo.
A sonhar.

(Herberto Hélder in "Ou o Poema Contínuo", 2001)
- Referência poética enviada por Flávia Soufer


26/09/2012

JUVENTUDE

Grito, por dentro calado
No cerne sinto o ardor
Prostrado em meus devaneios
Permaneço...
Fitando o muramento e discorrendo

Como pôde, o destino ser assim tão atroz
Me alvejando direto no ventre
Com seu olhar angelical
E o sorriso infernal
A brisa, a penumbra, tudo me recorda a ti

Feito truão perco meu comedimento
Obro como néscio, mesmo atinando
Incapaz de evitar, as dúvidas me alagam
Como posso eu, ser pechoso, granjeá-la?
Teria ela desvelo por minha pessoa?

Ou seria apenas um clichê comportamental
Daqueles que exibimos rotineiramente
No caso dela, costumeiramente
Afinal, tal venustidade
Certamente atrai sobejo postulantes

Mas, mesmo que a quimera não torne-se régia
Que o anseio não seja abrandecido
Ei de lembrar-me daquela noite
De teu riso, de seu olhar primoroso
Teus lábios portentosos

E, claro, de teu encantamento
Tua voz, tão afável
Na sapiência de que a perfeição não existe
Minha mente insiste em reverberar
"És perfeita"

E quando estou amparado em meus alicerces
Confiante de meus preceitos
Eis que teu vulto irrompe
Levando ao chão todo meu cosmo
Abalando cada corpúsculo de meu ego

A incerteza prepondera...


(Carlos Henrique Vicente)

19/07/2012

(IN) CONSEQUÊNCIA

Eu tentei ser humano mas não pude
Esta cova de vícios me enterra
Andando frio e escalpado nesta terra
Não há um só remédio que me cure

Um espírito desenganado, manchado e rude
Perambulando nos confins desta terra
Insatisfeito por eras e eras...
Não há um só lugar que eu não mude

Ser ninguém é meu costume
Nunca fui sendo ser
Já não vejo e deixei de crer:
Não há um só amor sem ciúme

(Eduardo Monga, SP, março de 2012.)

18/07/2012

ELA, AOS TRINTA E TRÊS

Ela havia imaginado tudo bem diferente.
Ainda com este Fusca enferrujado.
Uma vez, quase casou-se com um padeiro.
Antes, costumava ler Clarice, depois, Cabral.
Agora ela prefere resolver charadas na cama.
Dos homens, não tolera abusos.
Por anos foi petista, mas à sua maneira.
Nunca recortou cupons de desconto em jornais.
Quando pensa no Afeganistão, passa mal.
Seu último namorado, o intelectual, gostava de apanhar.
Vestidos de batique esverdeados, largos demais para ela.
Pulgões nas folhas da samambaia.
Na verdade, queria pintar, ou emigrar.
Sua tese, Conflitos religiosos no Nordeste, 1889
a 1930, e suas marcas na música popular:
bolsas, começos, e uma gaveta cheia de notas.
De vez em quando, sua vó manda-lhe dinheiro.
Danças acanhadas no banheiro, caretinhas,
horas de hidratante ao espelho.
Ela diz: pelo menos não morrerei de fome.
Quando chora, fica com cara de dezenove.

(Hans Magnus Enzensberger. Tradução e Contextualização de Ricardo Domeneck)
- Referência poética enviada por Flávia Soufer

13/06/2012

APONTAMENTO

A minha alma partiu-se como um vaso vazio.
Caiu pela escada excessivamente abaixo.
Caiu das mãos da criada descuidada.
Caiu, fez-se em mais pedaços do que havia loiça no vaso.

Asneira? Impossível? Sei lá!
Tenho mais sensações do que tinha quando me sentia eu.
Sou um espalhamento de cacos sobre um capacho por sacudir.

Fiz barulho na queda como um vaso que se partia.
Os deuses que há debruçam-se do parapeito da escada.
E fitam os cacos que a criada deles fez de mim.

Não se zanguem com ela.
São tolerantes com ela.
O que era eu um vaso vazio?

Olham os cacos absurdamente conscientes,
Mas conscientes de si mesmo, não conscientes deles.
Olham e sorriem.
Sorriem tolerantes à criada involuntária.

Alastra a grande escadaria atapetada de estrelas.
Um caco brilha, virado do exterior lustroso, entre os astros.
A minha obra? A minha alma principal? A minha vida?
Um caco.
E os deuses olham-o especialmente, pois não sabem por que ficou ali.

(Álvaro de Campos)
- Referência poética enviada por Flávia Soufer

25/05/2012

RISOS

Ri, criança, a vida é curta,
O sonho dura um instante.
Depois... o cipreste esguio
Mostra a cova ao viandante!

A vida é triste - quem nega?
- Nem vale a pena dizê-lo.
Deus a parte entre seus dedos
Qual um fio de cabelo!

Como o dia, a nossa vida
Na aurora é - toda venturas,
De tarde - doce tristeza,
De noite - sombras escuras!

A velhice tem gemidos,
- A dor das visões passadas -
A mocidade - queixumes,
Só a infância tem risadas!

Ri, criança, a vida é curta,
O sonho dura um instante.
Depois... o cipreste esguio
Mostra a cova ao viandante!

(Casimiro de Abreu)
- Referência poética enviada por Flávia Soufer
A DANÇA DA PSIQUÊ

A dança dos encéfalos acesos
Começa. A carne é fogo. A alma arde. A espaços
As cabeças, as mãos, os pés e os braços
Tombara, cedendo à ação de ignotos pesos!

É então que a vaga dos instintos presos
— Mãe de esterilidades e cansaços —
Atira os pensamentos mais devassos
Contra os ossos cranianos indefesos.

Subitamente a cerebral coréa
Pára. O cosmos sintético da Idéa
Surge. Emoções extraordinárias sinto...

Arranco do meu crânio as nebulosas.
E acho um feixe de forças prodigiosas
Sustentando dois monstros: a alma e o instinto!

(Augusto dos Anjos)
- Referência poética enviada por Daniel Palacios

14/05/2012




















(Marco Pezão)




















(Marco Pezão)













Estou só,
e é meu querer
estar só...

Mas, estando só,
falta faz
a companhia do meu só...

SOS

(Marco Pezão)
TRIO DAS SELVAS

Lá...
dentro dela,
fêmea das selvas.
Mulher bicho,
fera...

Corre pela mata,
foge dos piratas,
nada pelos rios,
traga arrepios.

Por lá...
as vozes dos gritos.
No abismo
teus três vultos.
Quase um insulto.
Quase uma guerra
nela...

Abocanha a floresta,
lambe estranhezas,
confessa belezas,
mistérios, pecados
desse bicho safado.

Nua...
dentro dela
ela pula
com curvas,
cabelos, cintura.

Nela
vivem três:
a índia,
a pantera,
a serpente.

Todas lá...
nas águas ferventes.
Ocultas...
pelas profundezas
elas dançam,
mergulham.

Quase se afogam,
quase se matam.

(Flávia Soufer)

XIII















“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...
E conversamos toda a noite, enquanto
A via-láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: “Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?”
E eu vos direi:”Amai para entende-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas”.

(Olavo Bilac)
- Referência poética enviada por Daniel Palacios

07/05/2012

03/05/2012

SÉRIE MINICRÔNICAS PAULISTAS

Todo dia um amor começa e outro termina...
No mesmo banco de praça eu vi um casal em prantos terminando o relacionamento, enquanto ao lado um outro inicia uma nova paixão num beijo ardente e tentador.
A vida é assim...e nesse sentido enviezado seguimos a vida.
Onde um chora outro ri, e onde outro ri um chora
A desbalança das vontades.
Tudo flutuando no daqui a pouco......(Barcos sem culpas)
Tudo encontrando destino próprio...(Buracos de gente)
E a pergunta fica: Onde isso vai chegar conosco? (Portos sem farois)
Cada brecha é uma fechadura.
Todo final é uma porta...para um novo começo nos confins das janelas...


(Eduardo Monga)

02/05/2012

FACA

"Soft Construction with Boiled Beens"
Salvador Dali

















  



Faca que corta
faca que assola
e pesa na alma,
essa faca de lentes agudas,
feito faca amolada pra degolar... e emoldurar
mentes pensantes envoltas de vidas em voltas...
sem voltas...
a menos que, por um segundo
você pare!!!
e veja e, olhe e, observe atentamente
o mundo à sua volta e as suas voltas...
e volte -se, aceite-se, submeta-se
a Si.
E faça a faca foder-se!!!


(Daniel Palacios)

26/04/2012

FAÇA

Faça poesia
Faça canção
Faça magia
Faça teatro
Faça uma dança
um gesto-emoção.

Faça amor...com força e vontade
mas faça com Amor
e corte e, pulse e sangre...
e, não importa o que saia
será sempre com gosto,
mesmo que seja sem rosto...
mas com o coração.


(Daniel Palacios)
NINFAS, ELFOS E FADAS

Fim de tarde...
um frio que aquece, entorpece
aquele frio de arrepio que chega rasgando
na nuca dos olhos dos homens
e das fadas...
Nuas como nunca...música!!!
Ninfas almas aladas
e elfos.


(Daniel Palacios)

19/04/2012

POEMA DO CHÃO QUE SOU















Há-me um chão
Um chão preso no meu olho
Para por os pés de minhas palavras
... Uma imagem marrom de chão
Um chão marrom de mim mesmo
Negro marrom
Um marrom de mata
Tão chão quanto o vermelho do meu barro infantil
Do meu lixão-brinquedo infantil
Do cheiro adulto de queimadas
E amarelo-chão, às vezes
Quando se resolvia, sem prenúncio
Escorrer da barreira com papelão na bunda
Mania de chão: a brincadeira de sê-lo
O chão de sempre, até que sempre seja
O chão de andar: pedaço do trabalho
O chão, que arado produz
E sai o milho, o feijão
Sai o trigo, nasce flor
O chão fértil, marrom de mim mesmo
De ser chão seu as costas do homem
E que dali pesa os anos
E fica as marcas dos tempos
O chão marrom de mim
A segurar as raízes dos pensamentos
A brotar ideias: Fruto poema
Da mesma cor verde-chão que faz surgir também o açúcar da cana
O milho amarelo de nossos medos
O urucum vermelho de nossa coragem
Um chão de homem de chão
Que faz de si a terra, o barro, a cama
A lama humana de ser onde se pisa
De ser de onde se pisa
De se pisar muitas vezes de onde não se é
Chão nosso de cada dia
Chão humano que somos nós de nossos medos
Um marrom medo nascido na terra fértil
Do chão que muitas vezes não queremos ser
Lembranças de quando fomos plantados no mundo
Para ser tão único com o lugar
Nascido daqui
Aquele menino
Esse cara: Marrom-terra que é isso tudo nele
Vai...
Vai plantar ideias no solo do teu mundo, homem de chão
Que é por onde as pedras deste teu chão choram.

(Eduardo Monga)

10/04/2012

ADENTRO, CHUVA!





















Desafogar extremos
fluir doces deleites, fantasias
escoar venenos, vendavais
com taças de vinagre e pimenta
da vida bebida, engasgada na alma
derramar livres vertigens

em transe, apalpar sensações
desentranhar suspiros vitais
e gotejar, correr em fio
o que não mais cabe
desse peito berrante pulsante
deixar vazar, embriaguez

com rabiscos dançantes
meus intrínsecos líquidos
jorrados nas grafias
ora tsunamis, raios e trovões
ora luz, rios infindáveis de feitiços
todos, sempre, aguaceiros de mim.

(Flávia Soufer)
POESIA BOÊMIA

Uma tarde, um calor
dois copos, dois corpos
uma paixão que arde
uma dor que só o amor consola...

Com sorte fujo da morte,
atravesso paredes
e, através de canções,
chego aos corações.
Chuvas de ácidas águas,
se transformam em monções...

Um corpo que pulsa,
pulsares pulsantes,
cravos e rosas,
canções dos amantes.

A dor que anuncias
e a traz em seus braços,
são mortes morridas,
venceu o cansaço.

E no peito um aperto,
deixando um vazio,
uma terra árida,
que ao ser arada,
traz vento, traz pó
e traduz sentimentos
de dentro da alma,
da alma encarnada,
de escuras moradas,
de mortes matadas
e vidas vividas,
assim...
para o nada.

(Daniel Palacios)

09/04/2012

DESEJO

Desejo...
curar teus lábios
beijar destroços...
colar cada pedaço de tua alma nua, como nunca...
com a língua...
e, percorrer teu corpo...
e a cada leve toque do teu gosto,
na brancura do teu rosto,
e nos teus cabelos negros, me enfeitiçar...
e me esconder diante de ti
no escuro breu de minha alma
que ao despertar diante de seu abismo...
se revelará...
sinistro...
como um bando de emoções no caos
estrelas e paixões perdidas,
naves e naus no espaço
cibernético e cósmico de si-mesmo,
universos de versos esquecidos,
à procura de um encontro...
e o que era luz se faz de sombras
e ao que assombra, ardendo em chamas...Luz!!!


(Daniel Palacios)

05/04/2012

PULSAR

Poesia que pulsa no coração
sentindo no oco da alma um vazio...
e, no corpo das cordas do violão,
dedilhando uma triste canção,
lá está ela...bela donzela...linda....
a Solidão.


(Daniel Palacios)

03/04/2012

ÁRIA

Áridas, paixões caladas
em desertos mudos
de surdas árias de canções.
Quem há de ouvir a minha voz
senão eu mesmo,
a ecoar por entre os cantos,
febril ardendo em prantos
entristecido e melancólico,
em fúria na mais plena e pura
melodia da minha alma,
sedento de luz e de calor?


(Daniel Palacios)

22/03/2012

OUTRO OUTONO

Outono é partida.
É calar-se, despir-se.
Outono é silêncio.
É romance, é poesia.

É estar no aconchego.
É o fechar das cortinas
para abrir, dentro de si,
suas próprias janelas.

Outono é a saudade
num copo de uísque.
É um pedaço que vai
para que outro venha.

Outono é meio amarelo,
meio marrom, meio laranja.
Cores caem, deslizam
pelo chão novos horizontes.

Outono é espera,
é ler as entrelinhas pelo ar.
Outono é busca e esperança,
é o mais profundo da alma.

Outono é canção úmida.
Escuro vento que seduz.
Outono é renascer
quando tudo parece morrer.

(Flávia Soufer)
ANNABEL LEE


Há muitos, muitos anos, existia
num reino à beira-mar
uma virgem, que bem se poderia
Annabel Lee se chamar.

Amava-me, e seu sonho consistia
em ter-me para a amar.
Eu era criança, ela era uma criança
no reino à beira-mar;

mas nosso amor chegava, ó Annabel Lee
o amor a ultrapassar,
o amor que os próprios serafins celestes
vieram a invejar.
       
Foi por isso que há muitos, muitos anos,
no reino à beira-mar,
de uma nuvem soprou um vento e veio
Annabel Lee gelar.

E seus nobres parentes se apressaram
em de mim a afastar,
para encerrá-la numa sepultura,
no reino à beira-mar.
      
Os anjos, que não eram tão felizes,
nos vieram a invejar.
Sim! Foi por isso (como todos sabem
no reino à beira-mar)
       
que um vento veio, à noite, de uma nuvem
Annabel Lee matar.
Mas nosso amor, o amor dos mais idosos,
de mais firme pensar, podia ultrapassar.
       
E nem anjos que vieram nas alturas,
nem demônios do mar,
jamais minha alma da de Annabel Lee
poderão separar.
        
Pois, quando surge a lua, há um sonho que flutua,
de Annabel Lee, no luar;
e, quando se ergue a estrela, o seu fulgor revela
de Annabel Lee o olhar;
       
assim, a noite inteira, eu passo junto a ela,
a minha vida, aquela que amo, a companheira,
na tumba à beira-mar,
junto ao clamor do mar.

 
(Edgar Allan Poe, tradução de Fernando Pessoa.)
- Referência poética enviada por Flávia Soufer

09/03/2012

AOS PEDAÇOS...DE MIM

A mulher, tão bela Deus a fez em sua carne
que de Adão e da tal costela, mal consigo me lembrar da esfera,
só me lembro das mil faces das pagãs Afrodite, Hera, Perséfone, Lilith e Eva.

Lembro somente das tuas curvas que um dia
tive ao meu lado por prazer em minha cama
dos crimes que cometemos e, das juras de amor que me fazias.

Insano, venho eu a me perder em minhas memórias
no doce mel que de tua gruta úmida escorria...
e me ofertava, banhando-nos em gozos de paixão e de luxúria.

Mulher...ó, mulher... que dos teus beijos
guardo somente o gosto amargo e a desventura
de percorrer-me todo no teu corpo, rio de almas nuas e impuras.

Me perdendo na imensidão de teus e meus desejos
encontrei-me qual cego tateando, a mais bela flor e o espinho
e me cortei...e, por certo hoje sei... não há nem mapa, nem caminho.

Uma esfinje, que a quem olha, em pedaços...se lhe devora
ante o abismo de léguas e mil léguas submarinas
entre lâminas de lendas infinitas e estórias incontadas.

E, se algum dia ainda hei de entender que bicho é esse,
será quando a morte vir beijar a minha fronte
e tu serás para mim, ainda mais vã, mais bela e doce.

Espero-te, teus sussurros a profanar meu túmulo e irromper a minha paz
pois de mim mesmo já parti e, o meu resto, em ruínas aqui jaz,
só restando ao pó do tempo as romãs e as heras ...ó pedaços de mim.


(Daniel Palacios)

22/02/2012

 UM VERSO CANTANDO RECIFE

Antes mesmo que amanheça
e a troça me procurar à concentração
Já anda em fervor meu coração
Como uma tocha de frevo acesa

Uma magia imersa
Tão natural como daqui ser
Já incluído no ritmo antes de nascer
E já passista antes que cresça

O passo na letra do contrapé
Um verso cantando Recife
Um tal de um disse me disse
Durante o grito de Evoé

Se Baco entre nós ainda estivesse
Nestas terras de Pindorama
Estaria entre nós tomando cana
e cantando frevo nuns botecos desses

Este sentimento me cobre de alegria
Envolve-me como um possuído
Que esta paixão vem desde menino
Que passa o ano esperando o dia

Olho na rua e esta chama contamina
O povo todo se ilumina
como se fosse uma lâmpada
As cores assim como as rimas
Vão tomando todas as ruas
E eu seguindo a dança tua
Sabendo que um dia vai acabar em purpurina.

(Eduardo Monga)
ANIVERSÁRIO

Se eu tivesse coragem suficiente,
para mostrar ao mundo quem sou,
não pensaria na dor de dente,
que em meu ciso agora pousou.

Se eu fosse talvez mais covarde,
do que hoje talvez já eu sou,
não fosse talvez menos homem,
da voz em que meu eco ecoou.

Se a roupa dos panos que visto,
servissem pra cobrir quem escondo,
não teria me avistado eu nú,
homem-besta vazio de sentidos.

Se eu sentisse talvez pouco ou muito,
as sutilezas deste mistério profundo,
talvez desejasse sincero e pudesse talvez ficar perto,
deste oco que me trouxe no mundo.

Trinta e três anos de vida,
agruras da lida e da dor,
mas também fé e alegria,
em algum canto ela está e, eu estou.

Respiro este ar poluído,
porque dele também parte faço,
em minhas tripas me agarro e vomito,
o que ontem eu era e hoje sou.

Homem de máquina grito,
o silêncio de um homem robô,
assombro, pavor, calafrio,
é apenas ausência do amor.

E se hoje eu clamo às estrelas,
é porque nelas eu vejo a luz,
mortas à espera do caos,
daquilo que um dia eu já fui.

Muro de escombros pesados,
que já pesaram toneladas demais,
não sei como comigo lhe trago,
até não poder nunca mais.

Melhor esquecer do passado...
mas como se dentro ele vive,
se dói, se corrói, carcomido
maldito em minha dor de dente?

(Daniel Palacios)

15/02/2012

A SERENATA

Uma noite de lua pálida e gerânios
ele viria com boca e mãos incríveis
tocar flauta no jardim.
Estou no começo do meu desespero
e só vejo dois caminhos:
ou viro doida ou santa.
Eu que rejeito e exprobro
o que não for natural como sangue e veias
descubro que estou chorando todo dia,
os cabelos entristecidos,
a pele assaltada de indecisão.
Quando ele vier, porque é certo que vem,
de que modo vou chegar ao balcão sem juventude?
A lua, os gerânios e ele serão os mesmos
— só a mulher entre as coisas envelhece.
De que modo vou abrir a janela, se não for doida?
Como a fecharei, se não for santa?        

(Adélia Prado)
- Referência poética enviada por Flávia Soufer


















Foto Poesia
(Marco Pezão)

14/02/2012

ILUSÃO ALCÓOLICA I

Vi, em plena Boa Vista
Uma estrela cadende passar por minha vista
Mas rapaz, porra nehuma
... Era um guardanapo que caia do prédio Tabira
Prefiro que outra pessoa recite um poema
No momento estou o bastante decepcionado.

(Eduardo Monga, Recife, 1998. Em plena Conde da Boa Vista.)
DANÇA DO SOLILÓQUIO DOS VENCIDOS

Perdido em minhas andanças
quase que como um náufrago,
trafego nesta rua escura chamada esperança.
Esperando não sei o que... talvez algo ou alguém para lutar...
pra que? por que? e por quem?

Se fui, ou se sou eu, já não sei mais,
mas aqui estou para me dizer...
frente a frente de mim mesmo...
que fui... e, voltei há pouco...
e, sim, EU SOU...sou eu mesmo... somente isso!

Venhas me ver,
não tenhas medo de se me olhar no espelho...
Eu sou você...você sou eu
E de mãos dadas, na madrugada....
dançamos a dança do solilóquio dos vencidos.

(Daniel Palacios)

13/02/2012

DAR VOZ AO POEMA:

Sarau "A Plenos Pulmões" - Casa das Rosas
11 de fevereiro de 2012


RIO DE VERTIGEM

À beira da morte,
nas rajadas das sombras
o meu temor entorpecido
desarma-se agora,
justamente quando ferido,
calado aos gritos.
Sem tempo, nem espaço,
em silêncio eu declaro
os escândalos que exalo.
Lapso do tempo
esquiva-se da vida
mas agoniza com brilho,
algo ainda viceja
- em mim, eu vi -
e assim escorre.
Sangra para renascer,
faz amanhecer a vida
para beber até engasgar.
Ora navegar, ora mergulhar...
Afogar-me nesse rio de vertigem,
em presentes segundos
embriagar-me com o elixir da ventura
e sorrir um descarado deboche
para os perigos de morrer
mais uma vez.

(Flávia Soufer)
PSICOLOGIA DE UM VENCIDO

Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme - este operário das ruínas -
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e á vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!

(Augusto dos Anjos)
- Referência poética enviada por Daniel Palacios

31/01/2012

ACHADOS E PERDIDOS

Procura-se Cultura, uma criatura nutrida.
Vangando gorda pelos cantos.
De tempos em tempos se alonga,
n'outas vezes se comprime, exausta,
com um monte de sanguessugas grudados nela.
Foi vista pela última vez em poder da burguesia
sob a influência dos pseudos intelectuais.
Qualquer informação cultural já é um grande resgate.

(Eduardo Monga)

19/01/2012

UMA BORBOLETA

Uma borboleta pousou em meu ventre.
Dissimulada, fez de brincar e cedi.
Refletida no olhar, assimilou meus sonhos e foi embora feliz.
(Rafael Bacciotti)

18/01/2012

XXI - SE EU PUDESSE

Se eu pudesse trincar a terra toda
E sentir-lhe uma paladar,
Seria mais feliz um momento...
Mas eu nem sempre quero ser feliz.
É preciso ser de vez em quando infeliz
Para se poder ser natural...

Nem tudo é dias de sol,
E a chuva, quando falta muito, pede-se.
Por isso tomo a infelicidade com a felicidade
Naturalmente, como quem não estranha
Que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e erva ...

O que é preciso é ser-se natural e calmo
Na felicidade ou na infelicidade,
Sentir como quem olha,
Pensar como quem anda,
E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre,
E que o poente é belo e é bela a noite que fica...
Assim é e assim seja...

(Poemas Completos de Alberto Caeiro, O Guardador de Rebanhos)
- Referência poética enviada por Rafael Bacciotti

17/01/2012

SABENÇA

Sou fragmento
Potente e encantado

Fragmento
Indecente e descrente

Sou inteiro
Puro e vincado

Inteiro
Obscuro e duro

Todo,
Não sei se sou.
Parte,
Se sou não sei.

Sou feito de palavra e tempo.
Sou feito de coisas nascendo no silêncio.

Das metades que me faltam sei,
Sei que todo não sou.

De infinito sou feito, eu sei,
Sei que parte apenas nunca serei.


(Adalto Fonseca Jr)

16/01/2012

ESTE É O PRÓLOGO

Deixaria neste livro
toda minha alma.
Este livro que viu
as paisagens comigo
e viveu horas santas.

Que compaixão dos livros
que nos enchem as mãos
de rosas e de estrelas
e lentamente passam!

Que tristeza tão funda
é mirar os retábulos
de dores e de penas
que um coração levanta!

Ver passar os espectros
de vidas que se apagam,
ver o homem despido
em Pégaso sem asas.

Ver a vida e a morte,
a síntese do mundo,
que em espaços profundos
se miram e se abraçam.

Um livro de poemas
é o outono morto:
os versos são as folhas
negras em terras brancas,

e a voz que os lê
é o sopro do vento
que lhes mete nos peitos
— entranháveis distâncias. —

O poeta é uma árvore
com frutos de tristeza
e com folhas murchadas
de chorar o que ama.

O poeta é o médium
da Natureza-mãe
que explica sua grandeza
por meio das palavras.

O poeta compreende
todo o incompreensível,
e as coisas que se odeiam,
ele, amigas as chama.

Sabe ele que as veredas
são todas impossíveis
e por isso de noite
vai por elas com calma.

Nos livros seus de versos,
entre rosas de sangue,
vão passando as tristonhas
e eternas caravanas,

que fizeram ao poeta
quando chora nas tardes,
rodeado e cingido
por seus próprios fantasmas.

Poesia, amargura,
mel celeste que mana
de um favo invisível
que as almas fabricam.

Poesia, o impossível
feito possível. Harpa
que tem em vez de cordas
chamas e corações.

Poesia é a vida
que cruzamos com ânsia,
esperando o que leva
nossa barca sem rumo.

Livros doces de versos
são os astros que passam
pelo silêncio mudo
para o reino do Nada,
escrevendo no céu
as estrofes de prata.

Oh! que penas tão fundas
e nunca aliviadas,
as vozes dolorosas
que os poetas cantam!

Deixaria no livro
neste toda a minha alma...

(Federico García Lorca, in 'Poemas Esparsos'
Tradução de Oscar Mendes)
- Referência poética enviada por Flávia Soufer
NATUREZA ÍNTIMA

Cansada de observar-se na corrente
Que os acontecimentos refletia,
Reconcentrando-se em si mesma, um dia,
A Natureza olhou-se interiormente!

Baldada introspecção! Noumenalmente
O que Ela, em realidade, ainda sentia
Era a mesma imortal monotonia
De sua face externa indiferente!

E a Natureza disse com desgosto:
"Terei somente, porventura, rosto?!
"Serei apenas mera crusta espessa?!

"Pois é possível que Eu, causa do Mundo,
"Quando mais em mim mesma me aprofundo
"Menos interiormente me conheça?!"

(Augusto dos Anjos)
- Referência poética enviada por Daniel Palacios
BORBOLETA NEGRA

Dança fatal
num vôo funesto.
És tu,
borboleta negra.

Que nos assobios do vento
traz os meus assombros e destroços.
Que na austeridade das tuas asas
estampa o meu número: trinta e três.

Entre oceanos e abismos, céus e trevas...
És tu no espelho, bem diante do meu rosto
afrontando o meu medo de expor nos olhos
o meu próprio medo resguardado.

Só não confundo-te com um corvo assassino
porque ainda voas como quem dança
e na ponta dos pés, posaste no meu âmago
diante de todas as minhas raízes imersas.

(Flávia Soufer)
DA LIBERDADE EM MOVIMENTO

Crescendo... pulsando a célula ritmica,
é que meu corpo sente a trajetória,
de algo que foi..., mas que ainda está por vir...

Ruminando...rusgas de meu passado,
é que calo com a voz de meus ecos,
e sinto algo que vai...e, que está prestes à explodir...

Roendo...como fazem os ratos,
é que trago no peito o chiado,
e sinto algo que cai... e, que um dia há de cair...

Tragando...na fumaça do mato,
é que vem o desejo de fato,
de um dia ser livre para ver e ouvir...

Sons, cores, gestos, amores...

(Daniel Palacios)
Bateu uma vontade de disparar, atirar mesmo. Não quero matar ninguém, não me leve a mal. Mas preciso disso.
Jogar tudo que está do lado de dentro para o lado de fora, sem medo. 
Como tudo que é velho, que se acumula, meus sentimentos ficam guardados no fundo de um armário. 
E com o passar do tempo, como objetos, ficam empoeirados.
Descobri só agora, com sua ajuda, que isso faz mal, depois de tanto tempo...
Como? Como alguém que já sofre de rinite não se deu conta?
 
(Rafael Bacciotti)

09/01/2012

DAS METÁFORAS

A Cidade é carnívora,
A Cidade é máquina inorgânica
É planta. É minério
A Cidade é máquina orgânica e estranha

Ora cinzenta e morta, ora colorida e viva.

Agressiva
Comedora de almas

A cidade mineral e corroída

Seus espinhos de aço ferem a alma já devorada do incauto cidadão.

(Adalto Fonseca Junior)
DA DOÇURA

Romã
Saci-Pererê
A manhã doce de um dia de chuva
Na rua pequenas poças turvas viram alegres pântanos.

(Adalto Fonseca Junior)
DA DOR

E tudo dói concretamente.
A dor corrrói.
Sulca o homem.
Sulca o solo da cidade.
Com bile amarela e negra.
A bile dos pobres humanos.
Desenha em seus corações marginais,
Com o féu de nós mesmos,
Um viés ocre,
Urbano.
Dor de si, miserável dor, sulcando todas as vidas.
Agora o dia se faz e se refaz em nossas mentes, em nossos corpos que perecem
Sob o sol nessa abóbada suja somos todos apenas loucos e vulneráveis.

(Adalto Fonseca Junior)
O QUE HÁ NO ESPELHO?

Sua carta ainda não lida.
Nossa despedida.
A frágil corrente.
Seus elos partidos.
A faca, seu fio e a dor.

(Adalto Fonseca Junior)
O QUE HÁ NO RETRATO?

A estrada até o oceano.
Pedras margeando o caminho.
Nossos laços desfeitos.
Nosso deserto.

(Adalto Fonseca Junior)
Se fado for
Se for noite
Mesmo se a estrada acabar em trator raiz
E a janela em deserto
O gado não pedra o espinho.

(Adalto Fonseca Junior)
Se desventura for
Se for morte
Mesmo se o infinito acabar em vida
E a alma em busca
A resignação não pausa a dor.

(Adalto Fonseca Junior)